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domingo, 4 de dezembro de 2011

Da natureza para a natureza

Confortável, leve, versátil e, principalmente, renovável. Essas são algumas das vantagens que fazem da madeira um dos melhores materiais para a construção de uma residência
(Publicado em 06/09/2009 n Gazeta do Povo -  FABIANE ZIOLLA MENEZES)

Modelo Champagnat, da Casas Curitiba. Possui 135 metros quadrados e está em exposição para os clientes
 Nos últimos cinco anos apenas 32 alvarás foram concedidos para construção ou reforma de edificações de madeira em Curitiba, de acordo com dados do departamento de Controle de Edificações da Se­­cretaria Municipal de Urba­­nismo. O material que definiu as residências paranaenses do século 19 feitas por imigrantes europeus, entre eles poloneses, ucranianos, etc, e era abundante na paisagem urbana de Curitiba e região até a década de 1940, já não é mais inteiramente usado para a construção de uma casa – embora a madeira seja o segundo material mais usado em construções em geral, para tarefas como escoramentos e fôrmas para pilares e vigas de concreto.
“Fatores como a quase extinção do pinheiro Araucária, conífera muito semelhante às árvores que os imigrantes tinham na Europa e que foi a principal matéria-prima de suas construções por aqui, e a construção de Brasília na década de 1960, ícone de modernidade que explicitou o uso da alvenaria e do concreto armado, levaram à troca da madeira por esses materiais”, explica Fábio Domingos Batista, arquiteto e mestre pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) com a tese A Tecnologia Construtiva em Madeira na Região de Curitiba: da Casa Tradicional à Contem­­po­­rânea.
Para Batista e outros técnicos especializados em madeira, ela não é mais largamente usada por causa de um preconceito de material de qualidade inferior. “Não sei explicar bem a origem desse julgamento, mas acredito que seja fruto do desconhecimento das pessoas em relação à madeira e suas qualidades. Hoje poucas pessoas nasceram ou cresceram em casas de madeira”, esclarece Batista.
Para recuperar esse conhecimento e avançar em termos de tecnologia construtiva seria preciso uma série de mudanças: do ensino do projeto e da construção com a madeira nas faculdades, cursos técnicos e profissionalizantes a uma indústria madeireira voltada para a produção do material para a construção civil. “Em países onde a técnica é desenvolvida, como nos Estados Unidos, fazer uma casa de madeira é como montar um lego, tudo na casa é previsto e processado industrialmente. Aqui a construção com a madeira ainda é muito experimental, artesanal.”
A melhor dica dos especialistas para o consumidor é, portanto, procurar por profissionais (arquitetos, engenheiros, marceneiros, etc) que já tenham experiência com a construção de casas de madeira.
Qualidades
São inúmeras as vantagens físicas da madeira. “Tem resistência me­­cânica alta, como impactos e torções, bom isolamento térmico e acústico (tem um índice bom de absorção de sons) e, por si só, já é um elemento arquitetônico bonito”, frisa o engenheiro calculista especializado em estruturas de madeira Luiz Sorio Filho.
Uma vantagem indireta e, talvez, a mais relevante para se escolher a madeira como material de construção é o fato de ser renovável. “Pode ser reutilizada várias vezes, para diferentes finalidades, como novas casas e móveis, e é natural”, afirma a diretora do Conselho Bra­­sileiro de Construção Sus­­ten­­tável (CBCS), Lilian Sarrouf. “Quando descartada, serve de adubo para novas árvores”, lembra Sorio Filho.
Também gasta menos energia para ser produzida. “Uma pesquisa do Laboratório Nacional de Enge­­nharia de Lisboa mostra que en­­quanto a madeira gasta 2,4 mil quilocalorias na sua produção, o concreto gasta 780 mil e o aço, 3 mi­­lhões”, informa Sorio Filho. Os valores são baseados na produção de uma tonelada de cada material.
Limitações
A suscetibilidade ao ataque de insetos xilófagos (que comem madeira) e a inflamabilidade são duas das li­­­mitações, não necessariamente desvantagens, da madeira como material de construção. “Quanto aos insetos, nós do sul temos uma vantagem, porque não temos o tipo de cupim que existe em São Paulo, que faz o ninho na terra e, por isso, é difícil de ser combatido. O nosso cupim se instala dentro de casa, é facil de ser achado”, aponta Sorio Filho. Ele dá um “porém” para a inflamabilidade. A madeira de espessura considerável quando exposta a altas temperaturas queima demoradamente, criando primeiro uma camada de proteção para só depois afetar o interior do material. “Isso dá mais tempo para a fuga se comparado a uma estrutura de metal que, na mesma situação, derrete e cai mais rapidamente.”
A Prefeitura de Curitiba, como precaução, exige que as construções de madeira tenham um recuo de pelo menos dois metros em relação às divisas (muros vizinhos) para evitar uma propagação maior de um eventual incêndio.
Origem legal
Saber de onde vem a madeira que se está comprando para a construção da casa é fundamental para combater o desmatamento. É preciso que ela seja de origem legal (seja de manejo florestal, floresta nativa ou reflorestamento). “Para isso é preciso verificar se a empresa vendedora tem o Documento de Origem Florestal (DOF), emitido pelo Ibama, ou equivalente estadual, para o transporte da madeira ou ainda ver se é certificada, por meio de documentos ou selos colados no material”, explica o coordenador do Centro de Tecnologia em Recursos Florestais do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), Geraldo Zenid.
Uma madeira certificada tem a produção observada e fiscalizada com frequência por uma instituição que atesta sua origem legal, além de outros fatores como respeito ao meio ambiente e responsabilidade social. No Brasil, as duas certificações mais usadas são a Cerflor, do Instituto de Nacional Metrologia, Normalização e Qualidade Indus­trial (Inmetro) e o Sistema FSC (Fo­­rest Stewardship Council, ou Con­­selho de Manejo Florestal).
Escolha
Uma parte fundamental da construção é a especificação: a indicação do tipo de madeira certo para cada uso (estrutura, fechamento de paredes, etc). “O tipo de madeira dependerá do uso e das medidas que serão tomadas na construção, como isolamento do solo, já que a umidade é a maior inimiga do material. Não existe apenas uma madeira certa para se fazer casa”, ressalta Zenid.
Madeiras mais resistentes (duras, o que também as fazem menos palatáveis para os insetos) em regra, como a itaúba, são as mais indicadas para a parte estrutural (casa e telhado). “Isso não quer dizer que outro tipo de madeira, como pinus, mais macio, não possa ser tratado, ganhando mais resistência para uso semelhante”, diz o engenheiro calculista Sorio Filho.
Zenid alerta que o consumidor deve estar atento ao encontrar, quando vai construir ou reformar, falácias quanto às espécies de madeira. “Tem-se a cultura de madeiras nobres e antigas, como ipê-rosa, que não existem ou estão quase extintas e, muitas vezes, o vendedor ou até mesmo o construtor não sabe especificar outro tipo que servirá para o mesmo uso. O consumidor acaba comprando gato por lebre.”
Para evitar o desmatamento de espécies em risco e orientar tanto profissionais quanto consumidores, o IPT, o Sindicato da Indústria da Construção Civil de São Paulo e a Secretaria de Meio Ambiente do estado criaram um manual para a escolha da madeira. O manual Ma­­deira – Uso Sustentável na Cons­trução Civil pode ser acessado no site www.ipt.br, no link de publicações do Centro de Tecnologia de Re­­cursos Florestais.

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